terça-feira, 6 de abril de 2010

OPINIÃO - Artigo

Carlos Alberto Di Franco

Igreja: informação versus campanha

A imprensa brasileira tem noticiado a respeito da crise que fustiga a Igreja Católica com razoável serenidade e equilíbrio. Os casos de abuso sexual protagonizados por clérigos são, de fato, matéria jornalística inescapável. O que me impressiona, e muito, é a perda do sentido informativo e o inequívoco tom de campanha assumido por alguns jornais norte-americanos.
Infelizmente, os casos reais de abuso sexual, acontecidos nas últimas décadas, mesmo que tenham sido menos numerosos do que fazem supor certas reportagens, são inescusáveis. Nada pode justificar nem atenuar crimes abomináveis como o estupro e a pedofilia. Um só caso de pedofilia, praticado na Igreja Católica por um padre, um religioso ou uma religiosa, é sempre demais, é inqualificável.
O Vaticano recebeu 3 mil denúncias de abuso sexual praticados por sacerdotes nos últimos 50 anos. Segundo monsenhor Scicluna, chefe da comissão da Santa Sé para apuração dos delitos, 60% dos casos estão relacionados com práticas homossexuais, 30% com relações heterossexuais e 10% dos casos podem ser enquadrados como crimes de pedofilia. Os números reais de casos de pedofilia na Igreja são, portanto, muito menores.
Os abusos têm sido marcadamente de caráter homossexual e refletem um grave problema de idoneidade para o exercício do sacerdócio. Afinal, uma instituição que, há séculos, defende o celibato sacerdotal tem o direito de estabelecer os seus critérios de idoneidade, o seu manual de instruções para a seleção de candidatos. A Igreja está, de fato, enfrentando as consequências de anos e anos de descuido, covardia e negligência dos bispos na seleção e formação do clero.
Philip Jenkins, um especialista não católico de grande prestígio, publicou o estudo mais sério sobre a crise. Pedophiles and Priests: Anatomy of a Contemporary Crisis (Oxford, 214 págs.) é o mais exaustivo estudo sobre os escândalos sexuais que sacudiram a Igreja Católica nos Estados Unidos durante a década de 1990. Segundo Jenkins, mais de 90% dos padres católicos envolvidos com abusos sexuais são homossexuais. O problema, portanto, não foi ocasionado pelo celibato, mas por notável tolerância com o homossexualismo, sobretudo nos seminários dos anos 70, quando foram ordenados os predadores sexuais que sacudiram a credibilidade da Igreja.
O autor não nega o óbvio: a objetiva gravidade dos fatos. Mas mostra como os crimes foram amplificados com o objetivo de desacreditar a Igreja. A análise isenta dos números confirma essa percepção. Na Alemanha, por exemplo, existiram, desde 1995, 210 mil denúncias de abusos. Dessas 210 mil, 300 estavam ligadas a padres católicos, menos de 0,2%. Por que só as 300 denúncias contra a Igreja repercutem? E as outras 209 mil denúncias? Trata-se, sem dúvida, de um escândalo seletivo.
Tentou-se, recentemente, atingir o próprio papa. Como lembrou John Allen, conhecido vaticanista e autor do livro The Rise of Benedict XVI, em recente artigo no The New York Times, o papa fez da punição aos casos de abuso uma prioridade de seu pontificado. “Um de seus primeiros atos foi submeter à disciplina dois clérigos importantes contra os quais pesavam denúncias de abuso sexual há décadas, mas que tinham sido protegidos em níveis bastante altos. Ele também foi o primeiro papa da história que tratou abertamente da crise”. Bento XVI tem sido, de fato, firme e contundente.
Em recente carta ao Corriere della Sera, o senador italiano Marcello Pera, um laico no mais genuíno sentido italiano da palavra, assumiu a defesa do papa e foi ao cerne da polêmica. “Desencadeou-se uma guerra. Não propriamente contra a pessoa do papa, pois seria inviável. Bento XVI tornou-se invulnerável por sua imagem, sua serenidade, sua clareza e firmeza.” A guerra continuará, “entre outras razões porque um papa como Bento XVI, que sorri, mas não retrocede um milímetro, alimenta o embate”.
Precisamos informar com o rigor dos fatos. Mas devemos, sobretudo, entender o que se esconde por trás de algumas manchetes e de certas interpretações.

C
arlos Alberto Di Franco é diretor do Master em Jornalismo, professor de Ética e doutor em Comunicação pela Universidade de Navarra, é diretor da Di Franco - Consultoria em Estratégia de Mídia. Contatos: difranco@iics.org.br. Transcrito, sem adaptações, do jornal O Popular (Goiânia-GO), de 05/04/10

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